terça-feira, 16 de dezembro de 2008

Armadilha de antimatéria vai testar a simetria da natureza

Pesquisadores japoneses desenvolveram uma armadilha de antimatéria que poderá ser utilizada para resolver um dos maiores mistérios do Universo, a chamada simetria fundamental da natureza.

Matéria e antimatéria
Segundo as teorias atuais, nosso Universo começou com o Big Bang há 13 bilhões de anos, quando emergiram as partículas fundamentais que formam a matéria.
Contudo, segundo uma parte da Teoria Quântica conhecida como simetria CPT (carga, paridade e tempo), o Big Bang deve ter criado quantidades iguais de matéria e antimatéria. Ora, então por que elas não se aniquilaram mutuamente e por que o Universo é formado principalmente por matéria?
Simetria da natureza
"Uma possibilidade é que a simetria CPT tenha sido quebrada de alguma forma," diz o pesquisador Yasunori Yamazaki, do Instituto Riken.
Foi justamente para testar experimentalmente essa possibilidade que Yamazaki e sua equipe desenvolveram a sua armadilha de antimatéria. Com ela eles esperam testar a simetria CPT comparando átomos de hidrogênio com átomos de anti-hidrogênio com uma precisão inédita.
Armadilha de antimatéria
O hidrogênio é formado por um próton, de carga positiva, e um elétron, de carga negativa. Um anti-hidrogênio é formado por seus equivalentes de antimatéria: um antipróton negativo e um antielétron positivo, conhecido como pósitron.
Inicialmente, os pesquisadores usaram sua armadilha de antimatéria para capturar uma nuvem de elétrons, que ficaram confinados por uma série de eletrodos cilíndricos. Um forte campo magnético forçou os elétrons a emitirem radiação síncrotron, que os resfriou. Nesse momento, 50.000 antiprótons de alta energia foram injetados na armadilha e misturados com os elétrons, que acabaram por resfriar também os antiprótons.
Assim que os antiprótons estão resfriados, os elétrons são ejetados da armadilha e um campo elétrico rotativo comprime e mantém a nuvem de antiprótons no interior da armadilha, reduzindo-a a um diâmetro equivalente à metade do seu tamanho original (cerca de 0,25 mm).
Agora os pesquisadores vão trabalhar na sintetização de um número suficiente de átomos de anti-hidrogênio para finalmente testarem a validade da hipótese da simetria CPT.
Para conhecer a etapa anterior do trabalho, quando o projeto da armadilha de antimatéria foi concebido, veja Antimatéria poderá ser guardada em equipamento portátil.

Nas asas da antimatéria

Engenheiro americano defende que veleiro de antimatéria poderia ser a tecnologia capaz de sobrepujar a barreira que separa a humanidade das viagens interestelares
Salvador Nogueira escreve para a "Folha de SP";
O engenheiro nuclear americano Steven Howe aposta que, embora hoje apenas engatinhem, os bebês do Sistema Solar vão um dia crescer e fazer o que, nos velhos tempos de berço do século 21, parecia impensável: construir artefatos que tornarão o desafio de atravessar as distâncias interestelares uma trivialidade.
Financiado pelo Instituto de Conceitos Avançados da Nasa (agência espacial dos EUA), ele atualmente trabalha em uma tecnologia que pode ser a solução. Sua idéia é construir um veleiro espacial -movido a antimatéria.
Tudo que já se fez e se falou sobre viagem espacial, incluindo aí alunissagens, estações orbitais e sondas automáticas enviadas às profundezas do Sistema Solar, são como ir até a esquina, quando comparadas às dimensões de uma viagem interestelar.
Se para ir da Terra à Lua é preciso percorrer a supostamente grande distância de 383 mil quilômetros, o percurso daqui até Alfa Centauri, a estrela mais próxima do Sol, é cerca de 98 milhões de vezes maior.
As dimensões são tão absurdas que a medida preferida das distâncias interestelares é o ano-luz -o quanto a luz é capaz de percorrer em um ano, zunindo pelo espaço vazio a impensáveis 300 mil quilômetros por segundo. Para ir do Sol a Alfa Centauri, a luz, que é a coisa mais rápida que existe, gasta quatro anos. O artefato humano mais distante já enviado ao espaço, a sonda Voyager-1, lançada em 1977, hoje está a pouco mais de 12 bilhões de quilômetros da Terra.
Para chegar a Alfa Centauri, precisaria cobrir essa distância mais umas 3.200 vezes. Se fosse na mesma balada, estaria chegando lá no ano 82002.
O que levanta a pergunta: será que os filhos do Sistema Solar estão irremediavelmente restritos aos domínios desse quintal compreendido por nove planetas, suas luas e mais alguns pedregulhos afins remanescentes de sua origem?
Howe vem gestando a noção de um veleiro a antimatéria desde pequeno, quando foi inspirado por um velho seriado de ficção científica que mostrava naves alimentadas por um motor de reação de matéria e antimatéria, viajando pela Via Láctea como se estivessem indo até a padaria mais próxima: "Jornada nas Estrelas" (Star Trek). "Foi lá que eu primeiro ouvi falar de antimatéria, quando era adolescente. De certo modo, foi isso que me colocou no caminho que eu trilho hoje em dia."
Ao contrário do que pode parecer, antimatéria não é um conceito mirabolante criado para roteiros de ficção científica. Trata-se de uma decorrência direta da principal teoria física que explica a composição de tudo que existe no mundo em termos de suas menores unidades, o Modelo Padrão. A matéria com que todo mundo está familiarizado é aquela composta por átomos cujos componentes são os prótons, com carga positiva, os nêutrons, com carga neutra, e os elétrons, com carga negativa.
Mas o Modelo Padrão também sugere a existência de partículas muito similares, com cargas opostas -ou seja, prótons negativos e elétrons positivos. Juntos, formariam átomos iguais, mas com propriedades opostas. Antiátomos, se preferir. Curiosamente, todo o Universo conhecido é feito de matéria -se houve produção de antimatéria durante o Big Bang (a explosão que gerou o cosmos e tudo que há nele), ela sumiu por completo.
O que não é uma hipótese tão desmiolada: para fazer sumir antimatéria, basta chocá-la com matéria. As duas se aniquilam mutuamente e liberam sua massa na forma de energia -o que não é pouca coisa. Segundo a teoria, a energia contida em uma dada quantidade de matéria é igual à massa multiplicada pelo quadrado da velocidade da luz. "Para ir longe, a nave precisa ter alto valor de energia por quilo", explica Howe. "Energia nuclear poderia permitir uma missão a Plutão ou um pouco mais longe, mas não uma missão à estrela vizinha. Antimatéria tem mil vezes mais energia do que combustível nuclear."
Onde está Wally?
Tudo bem, antimatéria pode ser o Santo Graal da liberação de energia. Mas, se ela não existe na natureza (pelo menos, não mais), falar de seus poderes miraculosos não é perda de tempo?
Quando há um acelerador de partículas por perto, certamente não. Usando essas gigantescas máquinas, os cientistas podem fazer colidir minúsculos pedaços de matéria a velocidades impressionantes. O resultado do choque é a conversão de energia num verdadeiro zoológico de partículas elementares -entre elas, antipartículas.
Capturadas por armadilhas magnéticas, essas antipartículas podem ser armazenadas e manipuladas. E vários progressos têm sido feitos no sentido de aumentar o ritmo em que antiátomos podem ser produzidos nesses laboratórios. Mas ainda estão bem longe de viabilizar fábricas eficientes de antimatéria -hoje gasta-se muito mais energia produzindo essas partículas do que o que se obteria com o resultado de sua aniquilação. "Antimatéria é cara para se produzir agora", diz Howe.
"Mas é o sistema perfeito de armazenagem de energia. Vamos investir um bocado em instalações em terra para produzir miligramas de antimatéria, mas esses miligramas vão enviar uma nave para o espaço profundo. E, se perseguirmos essa tecnologia, vamos encontrar meios de produzi-la de modo mais barato", arremata.
Apostando nisso, em 2000, Howe fundou a empresa HBar Technologies, cujo objetivo é justamente desenvolver várias aplicações de uso de antimatéria, indo de usos médicos a exploração espacial. "Estamos estudando várias aplicações comerciais para as quantidades de antimatéria produzidas hoje no Fermilab [Laboratório Nacional Acelerador Fermi, em Batavia, Illinois, nos EUA].
As principais apostas são o uso de antimatéria para detectar câncer e também matar tumores", conta. No campo espacial, entretanto, ainda há uma grande barreira para a aplicação imediata. Como lançar ao espaço um equipamento contendo antimatéria que, em caso de falha, produziria uma explosão de proporções nunca antes vistas? Essa é uma boa pergunta, para a qual Howe ainda não tem resposta.
"Com as habilidades que temos hoje, não poderíamos lançar muita antimatéria para o espaço", afirma. "Mas lembre-se de que a missão do Instituto de Conceitos Avançados da Nasa, o financiador dessa pesquisa, é examinar tecnologias para daqui a 40 anos. Nossa meta é identificar as possibilidades e projetar o caminho para atingi-las. Com sorte, conforme desenvolvermos a habilidade de produzir e armazenar antimatéria nas próximas décadas, vamos ter a habilidade de protegê-la no lançamento."
Vela de urânio
O conceito de sonda interestelar que Howe desenvolveu funciona em um sistema combinado de fissão nuclear e aniquilação de antimatéria. A vela da sonda, recoberta por uma camada de urânio, seria bombardeada por partículas de antimatéria.
A energia liberada dispararia um processo de fissão dos átomos de urânio (como acontece na explosão de uma bomba atômica), que por sua vez geraria mais energia. As liberações energéticas conjuntas propeliriam a nave. E a boa notícia é que a intensidade das reações energéticas pode ser precisamente controlada pelos disparos de antimatéria -evitando que a nave simplesmente inicie uma reação em cadeia que faça com que ela exploda. Graças a isso, o sistema pode oferecer aceleração por um período bem longo, cerca de 1 milhão de segundos -bem mais do que qualquer outra sonda já inventada.
Segundo Howe, com uma vela muito menor (e portanto mais factível) do que as gigantescas exigidas para os projetos de veleiros solares (que são propelidos pela própria luz vinda do Sol ao se chocar com a gigantesca superfície das velas), seria possível levar sua nave movida a antimatéria até a nuvem de Oort, o enorme cinturão de velhos cometas e asteróides formado bem além da região dos planetas durante o nascimento do Sistema Solar. O mesmo sistema, potencialmente, poderia ser empregado na primeira sonda interestelar humana.
Por ora, são apenas idéias, movidas por ciência básica, algum embasamento experimental e muito entusiasmo. Mas só o fato de já haver uma proposta para levar a presença do homem para além do confinamento de seu próprio sistema planetário já é um alento para acreditar que mais uma barreira supostamente intransponível possa cair diante da inventividade humana.
Se isso vai mesmo acontecer, e se a antimatéria vai ter algo a ver com isso, ainda é cedo para dizer. Howe está convicto: "Antimatéria é uma tecnologia na sua infância", diz. "Acredito que nas próximas décadas a antimatéria terá o mesmo impacto nas nossas vidas que o transistor teve nos últimos 40 anos. Em duas décadas poderemos testemunhar uma sonda ser enviada para fora do Sistema Solar, rumo ao espaço desconhecido."(Folha de SP, 24/11)

Em busca da antimatéria

A antimatéria está sendo estudada em avançados centros de pesquisas e poderá esclarecer alguns grandes mistérios científicos, entre eles, a origem do universo.
Em um depósito, em Genebra, na Suíça, está guardada uma pequena e terrível massa, cuja força explosiva é 100 vezes maior que a do urânio com o qual se preparam as bombas atômicas. Ela é utilizada em experiências mediante as quais se tenta esclarecer alguns grandes mistérios científicos, como, por exemplo, a origem do Universo. É chamada antimatéria e, pelo menos por enquanto, não oferece perigo, por ser usada em quantidades insignificantes. É certo, todavia, que grandes quantidades de antimatéria representarão para a humanidade uma fonte de energia ainda impossível de calcular.

Mas o que é antimatéria? A idéia de que pudesse existir algo assim surgiu no final dos anos 20 e seu pai foi o físico inglês Paul Dirac (1902-1984). Já havia sido divulgada há algum tempo a Teoria da Relatividade, pela qual Albert Einstein ensinou que matéria e energia são intercambiáveis, ou seja, podem se transformar uma na outra. Dirac começou investigando as partículas do átomo, entre elas os elétrons, à luz da Teoria da Relatividade e da Mecânica Quântica (SUPERINTERESSANTE nº 2 e 3). Seu objetivo, sem dúvida ambicioso, era descobrir em um denominador comum a ambas. Nesse trabalho conseguiu desenvolver fórmulas e equações matemáticas que, efetivamente, são úteis tanto no campo da Relatividade quanto no da Mecânica Quântica.
Dirac verificou que uma dessas equações não descrevia apenas o comportamento dos elétrons, como ele esperava, mas também oferecia soluções que não se acomodavam às regras da Física comum. Afinal Dirac descobriu o nó da questão - as partículas com as quais estava trabalhando não eram elétrons normais: sua massa era exatamente a de um elétron comum, mas sua carga elétrica era positiva, em vez de negativa. Parecia, em suma, uma imagem refletida no espelho, um elétron ao contrário. Um antielétron.
As experiências de Dirac eram puramente teóricas. Algum tempo depois o físico norte-americano Carl Anderson, quando fazia experiências com radiação cósmica, conseguiu demonstrar que os antielétrons existiam de fato. Tais partículas receberam, então, o nome de pósitrons - e Anderson, por isso, ganhou um prêmio Nobel em 1936. O passo seguinte foi descobrir que todas as partículas têm sua correspondente antipartícula.
Ou seja, existem os antiprótons, antinêutrons etc. São eles que formam a antimatéria. Atualmente já é possível produzir antipartículas em laboratório, em condições controladas. O Centro Europeu de Investigação Nuclear (CERN), em Genebra, produz antiprótons, conservados em campos magnéticos para dedicadas experiências.
As perspectivas são muito estimulantes: hoje tem-se a certeza de que estas antipartículas podem se juntar para formar antiátomos. E é até possível que existam no Universo antiestrelas, antiplanetas - e anti-homens, como explicou o próprio Dirac, no discurso ao receber o prêmio Nobel, em 1933. Para ele, é mera casualidade o fato de que até a Terra tenha sido formada de matéria e não antimatéria, "e é absolutamente possível que ocorra exatamente o contrário com outros corpos celestes". Para fazer uma afirmação tão atrevida Dirac se baseou na profunda simetria da natureza.
Para que se forme um pósitron é preciso concentrar certa quantidade de energia em um único ponto. Se houver condições adequadas, aparecerá não uma partícula mas um par delas, ambas formadas diretamente da energia; uma será sempre um pósitron, outra um elétron. Ou seja, partículas e antipartículas se formam sempre aos pares. Uma equilibra a outra. O processo inverso também é verdadeiro: se um elétron colide com pósitron, ambos se aniquilam mutuamente, e suas massas combinadas se liberam como energia, em forma de raios gama.
Se da energia pode-se produzir matéria, cria-se a grande esperança de que, enfim, será possível esclarecer a origem do Universo. No passado os astrônomos acreditavam que o Universo se formara a partir de uma reserva básica de massa, existente desde o princípio. Agora tem-se explicação mais satisfatória: supomos que a massa se formou, pouco a pouco, por meio de processos físicos. Não é necessário muita fantasia para imaginar que, logo após o Big Bang, a grande explosão que deu origem ao Universo, havia energia mais do que suficiente para produzir toda a massa hoje conhecida.
Uma conclusão se impõe: se é certo que, quando se cria matéria a partir da energia, sempre se cria uma quantidade igual de antimatéria, então o universo deve ser composto de ambas em quantidades iguais. Foi o que levou Dirac a fazer sua especulação sobre a existência de antiestrelas. A simetria entre matéria e antimatéria sugere que uma antiestrela ou uma antigaláxia teriam exatamente o mesmo aspecto que uma estrela ou uma galáxia comum. Ou seja, é perfeitamente possível que a nebulosa de Andrômeda, por exemplo, seja constituída de matéria ou antimatéria.
Em todo caso, a realidade mostra que as coisas não são assim tão simples. A partir dos anos 60, os cientistas começaram a entender melhor os acontecimentos relacionados com o Big Bang - e logo se deram conta de uma grande contradição. A fase inicial do Universo se caracterizou por um calor colossal e uma surpreendente uniformidade. O calor tornou possível o aparecimento de pares de partículas e antipartículas, que se juntaram formando uma espécie de sopa homogênea.
Enquanto o Universo se dilatava e esfriava a grande velocidade, só havia um destino possível para esses pares de partículas e antipartículas: a mútua a destruição. Os pósitrons colidiram com os elétrons, os prótons com os antiprótons e os nêutrons com os antinêutrons. Sempre, o resultado foi uma explosão destruidora. Nessas circunstâncias, não poderia ter sobrevivido muita matéria, nem o Universo estaria cheio de átomos, mas de raios gama.
No entanto, não é assim: a matéria existe e os átomos estão em toda parte. Os pesquisadores trataram, então, de descobrir o mecanismo da natureza responsável pela separação de matéria e antimatéria, evitando aquela orgia de destruição. Nada conseguiram, mas os primeiros radio telescópios instalados a bordo de satélites artificiais permitiram descobrir que no Universo não há tantos raios gama como se imaginava.
Foram feitos, então, cálculos teóricos para saber quanta antimatéria poderia haver na Via Láctea que ainda não tivesse sido descoberta. Os pesquisadores partiram do fato de que também no vasto Universo objetos colidem ocasionalmente e que não existe espaço vazio, mas enormes quantidades de partículas de gás e pó. Sendo assim, ainda que só uma parte de nossa galáxia fosse constituída de antimatéria, haveria um constante cintilar de raios gama. Os resultados obtidos até agora não indicam que a Via Láctea possa ter mais do que uma milionésima parte de sua massa constituída de antimatéria.
Algo parecido ocorre nas demais galáxias: quando se chocam umas com as outras, verifica-se que são formadas de matéria e não de antimatéria. Se realmente existe, a simetria entre elas deverá aparecer num campo espacial maior do que o Universo conhecido. Neste, a antimatéria é uma raridade. Fica a pergunta: será que em algum lugar existe a antimatéria em grande quantidade?
Por meio de sondas enviadas às camadas mais altas da atmosfera se descobriu que a Terra está exposta a um contínuo bombardeio de antiprótons, que chegam do Universo e formam parte da radiação cósmica geral. Mas eles não são indício de que existam antiestrelas, por exemplo. Como acontece nas refinadas instalações do acelerador de partículas do CERN, os antiprótons podem se formar, no Universo, a partir de partículas comuns, desde que ocorram entre elas choques muito violentos. Como os raios cósmicos são ricos em energia, devem produzi-los com facilidade quando atravessam o gás interestelar.
Para determinar a quantidade de antimatéria que há no Universo precisamos buscar núcleos de anti-hélio. Depois do hidrogênio, o hélio é a substância mais comum do espaço cósmico. Um único núcleo de anti hélio seria indício importante da existência de antiestrelas; formado por dois antiprótons e dois antinêutrons, trata-se de uma estrutura que não se constitui ao acaso.
Na busca de melhores resultados, os pesquisadores norte-americanos pretendem colocar em órbita, na próxima década, o Astromagi. Esse instrumento, a bordo de uma estação espacial, será equipado com ímãs supercondutores muito potentes e, por isso, capazes de desviar a trajetória das partículas super-rápidas. Assim, uma barreira de detectores será capaz de distinguir se determinado núcleo é formado de hélio ou anti-hélio: se os ímãs desviarem as partículas de hélio para a esquerda, desviarão as de anti-hélio para a direita.
Se a proposta for positiva e pudermos então dar como certa a existência de antiestrelas, também será certa a existência de antiplanetas, anticometas e anti tudo o mais. Podemos perguntar, a partir daí: o que aconteceria se um corpo com mais substância que um núcleo de anti-hélio penetra-se no Universo conhecido a altíssima velocidade? É provável que ao colidir com os corpúsculos de matéria produziria raios de energia e novos corpusculos, estes de antimatéria.
Alguns deles poderiam chegar à Terra. O choque da antimatéria com o planeta produziria uma explosão equivalente à de uma bomba atômica. Teria sido isso que aconteceu no começo do século na região siberiana de Tunguska, de cuja destruição tanto se falou, sem que se pudesse descobrir o que realmente ocorreu? Teria sido esta a causa do desaparecimento dos dinossauros ou dos periódicos cataclismos que castigam a Terra?
Pesquisas recentes demonstraram que partículas microscópicas, procedentes do espaço, estão constantemente entrando na atmosfera terrestre. As que são suficientemente pequenas conseguem escapar da destruição, porque as forças de atração produzidas entre os átomos normais acabam formando uma barreira de proteção em torno da antimatéria. Supõe-se que essas antipartículas estejam carregadas eletricamente por ionização e assim fiquem expostas aos campos elétricos da atmosfera terrestre (por exemplo, os que se formam durante as tempestades).
Seriam as tormentas que acenderiam o pavio da explosão responsável pela destruição das antipartículas. A energia assim liberada tem o aspecto de uma bola vermelha e incandescente, que dura pouquíssimos segundos. Há muitas descrições dessas bolas que aparecem no meio de uma tempestade e desaparecem repentinamente, com um forte estampido. O fenômeno chama-se raio globular e é um mistério para os cientistas: ninguém até agora conseguiu reproduzi-lo em laboratório. É possível que no futuro se consiga relacioná-lo com a antimatéria.
Enfim, é muito pouco, quase nada, o que sabemos sobre a antimatéria - embora já possamos fabricá-la. Seguramente será mais prático produzir a antimatéria no espaço, pois ali existe o vazio necessário, e a gravidade não provoca problemas. A antimatéria é útil quando se precisa armazenar grandes quantidades de energia, com peso e volume ínfimos. Poderia ser utilizada para impulsionar veículos interplanetários, por exemplo. E poderia, sem dúvida, ser utilizada para a guerra. O Instituto de Investigação da Rand Corporation, nos Estados Unidos, já concluiu um estudo onde registra a possível aplicação da antimatéria em foguetes, armas lançadoras de raios e na alimentação de lasers de raios X. O estudo afirma que a tecnologia para isso poderia ser desenvolvida em cinco anos. Outros estudos patrocinados pela Força Aérea dos Estados Unidos, estão em curso, sob protestos da comunidade científica internacional.
Mas a investigação em torno da antimatéria, nos laboratórios civis, também avança rapidamente. Logo entrará em funcionamento, no CERN de Genebra, um novo sistema de conservação dos antiprótons que permitirá estudá-los com muito mais precisão. Até agora produziam-se antiprótons mediante choques de alta energia, o que os levava a se deslocar quase à velocidade da luz (300.000 quilômetros por segundo). Agora eles são submetidos a um aparelho chamado LEAR (sigla em inglês de Light Energy Antiproton Ring ou Anel de Antiprótons de Baixa Energia), que reduz consideravelmente essa velocidade. Domesticados, o antiprótons caem na chamada Armadilha de Penning, onde são continuamente atirados para a frente e para trás, por meio de campos magnéticos que evitam que eles se choquem com paredes.
É ali que se pode fazer experiências com eles. Por exemplo, comparar sua massa com a dos prótons, verificar se e como são afetados pela gravidade. Enfim, verificar se realmente matéria e antimatéria são simétricas, como sempre se acreditou. Já se passaram mais de 50 anos desde que o físico Paul Dirac apresentou ao mundo científico suas equações, mas as investigações sobre a antimatéria estão apenas começando.